9.10.05

Queremos iniciar o debate, deixando algumas questões e desafiando-vos, desde já, a arriscarem algumas respostas ou a colocarem novas perguntas:

  • Sem desejo sexual, pode existir uma relação amorosa feliz?
  • Sem relações sexuais, pode existir uma relação amorosa feliz?
  • Porque é que, por vezes, entre duas pessoas com uma relação amorosa, o desejo sexual permanece vivo, mas a atracção sexual deixa de existir?
  • Uma prática sexual regular potencia ou inibe o desejo sexual?
  • Pode existir uma prática sexual satisfatória entre duas pessoas, sem que entre elas exista uma atracção sexual? É o que acontece no sexo virtual?
  • Uma mulher sabe sempre melhor do que um homem o que outra quer sexualmente?



Na última Zona Livre demos início a este projecto e lançámos uma proposta de debate sobre um tema: O Desejo. Desejo de proximidade, desejo de intimidade, desejo sexual - iguais, próximos, independentes? Que formas pode ter o desejo sexual, como se manifesta, o que é?

Partimos, daqui, para uma análise dos conceitos de desejo sexual e de atracção sexual, no sentido de situar e esclarecer as ligações entre desejo, atracção e comportamentos relacionados. Encontrámos muitas questões, dúvidas, opiniões e, sobretudo, ficámos convictas do interesse de reflectir e debater sobre este tema. Por isto, dedicámos este texto ao desejo, à atracção e aos comportamentos e queremos continuar um debate a partir de um conjunto de perguntas, aspirando a que a partir delas surjam novas questões, ideias, opiniões, informações e outros comentários.

Para Félix López e Antonio Fuertes, o desejo sexual tem uma base biológica, verificando-se que as pessoas sentem o desejo sexual como uma necessidade de actividades sexuais. Esta necessidade pode manifestar-se por fantasias sexuais, tensão sexual e vontade de contacto com outra pessoa. Segundo estes autores, para que uma pessoa sinta desejo sexual não tem de existir alguém, ou algo, que é objecto desse desejo. O desejo sexual é um estado interno sentido pela pessoa.

Para os mesmos autores, a atracção sexual é o resultado da existência de desejo sexual e de um objecto desse desejo. Quando existe desejo sexual por alguém, ou por algo, sente-se atracção sexual. A atracção dá-se porque alguém, ou algo, é percepcionado como excitante, com valor erótico, provocando uma tendência de aproximação, conquista ou relação, se não estiverem presentes outros elementos que contrariem essa tendência.

O desejo sexual pode existir sem atracção sexual e pode, também, permanecer sem ser traduzido em comportamentos.

Os comportamentos de satisfação da tensão sexual, resultante do desejo, são diversos e incluem a masturbação e as relações sexuais com outras pessoas. Por outro lado, os comportamentos sexuais nem sempre têm na sua origem um estado de desejo sexual, podendo resultar simplesmente da presença de estímulos, como sons, cheiros, toques ou imagens que provoquem excitação. Como todos os comportamentos humanos, os comportamentos sexuais são o resultado da interacção das muitas dimensões que existem em cada pessoa. A forma como cada mulher se comporta sexualmente depende do seu estado hormonal, nomeadamente da fase do ciclo menstrual, do seu estado de saúde, de bem-estar, mas também das suas crenças e valores, bem como da forma como pensa e sente a sua sexualidade e a dos outros.

Iniciámos o debate sobre desejo, atracção, comportamento, no lanche/encontro do Clube Safo que foi organizado e realizado no Porto, no dia 1 de Outubro. Aí, num grupo de oito pessoas, jogámos, pensámos e discutimos à volta destes temas. Queremos continuar o debate, deixando algumas questões e desafiando-vos, desde já, a arriscarem algumas respostas ou a colocarem novas perguntas:

§ Sem desejo sexual, pode existir uma relação amorosa feliz?

§ Sem relações sexuais, pode existir uma relação amorosa feliz?

§ Porque é que, por vezes, entre duas pessoas com uma relação amorosa, o desejo sexual permanece vivo, mas a atracção sexual deixa de existir?

§ Uma prática sexual regular potencia ou inibe o desejo sexual?

§ Pode existir uma prática sexual satisfatória entre duas pessoas, sem que entre elas exista uma atracção sexual? É o que acontece no sexo virtual?

§ Uma mulher sabe sempre melhor do que um homem o que outra quer sexualmente?

Na próxima Zona Livre, contamos poder relatar momentos e resultados deste debate, o que só será possível se o debate for participado. Queremos, também na próxima Zona Livre, alargar a abordagem ao tema Desejo, desenvolvendo as suas ligações com as relações amorosas, o enamoramento e o amor.


Bibliografia utilizada:
López, F.; Fuentes, A. (1999). Para compreender a Sexualidade. Lisboa: Associação para o Planeamento da Família. Tradução de António Manuel Marques e Lurdes Silva.

14 comentários:

Anónimo disse...

São imensas perguntas para um post único. Mas a proposta é estupenda. Só tenho uma coisa a apontar: as sexualidades, no feminino ou não, começam pela nossa construção pessoal. Pode existir ou não sexo, pode ser ou não satisfatório, pode ou não haver ocasião para ele, e até pode nem existir sexo mas a sexualidade continua lá e faz parte do todo que cada uma de nós é, faz parte da personalidade, da nossa natureza, das influências educacionais, dos nossos medos e da nossa curiosidade. Antes de tudo o resto, a sexualidade vem de dentro e das pessoas que nós somos.
De resto, estou muito contente por terem aberto este espaço. Vamos a isto!

Anónimo disse...

É bom constatar que vêm surgindo apostas sérias de esclarecimento em relação a esta temática. Obviamente que aquilo que é descrito na internet nem sempre corresponde ao que se vive na realidade. Aqui, há dois conceitos em causa: amor e sexo. Estas duas belas palavras fazem-me lembrar uma música da brasileira Rita Lee. São termos distintos, não apenas na ortografia mas também no significado. Eu sou da opinião que pode haver sexo sem amor e que pode haver amor sem sexo. Passo a explicar... Nasci em Inglaterra e sempre andei vagueando um pouco por todo o mundo, ainda que involuntariamente e, em toda a minha vida, fui sempre muito libertina; houve alturas em que dormia com um homem diferente por dia. Isto é sexo sem amor, o que, na maior parte das vezes sabe a muito pouco, ou mesmo a nada, porque se alarga o vazio dentro de nós. Vale a pena, de vez em quando. Amor sem sexo... é triste. Penso que só há amor sem sexo quando se ama alguém e não se é correspondido. Acima de tudo, eu acredito no amor aliado ao sexo. Não sou uma lunática, pelo contrário, tenho os pés bem assentes na terra, sei pensar. Mas sei ver também o outro lado. As maiores felicidades para o blog.

Anónimo disse...

Penso que é importante discutir o sexo, o desejo e o amor.

Basta lembrar que a nossa sociedade foi «educada» na ausência de desejo sexual na mulher e só muito recentemente se começa a tomar consciência de que esse desejo existe concretamente

Basta lembrar que muitas mulheres dizem que «o sexo é tão natural como respirar» mas depois aceitam com dificuldade, ou nem aceitam, a existência de relações sexuais livres nelas próprias e nas outras, ainda que pessoas sós.

O caso do amor é ainda mais complicado. E vou já para o caso extremo de se amar a companheira e fazer amor com ela assiduamente e mesmo assim... desejar outras.

Destapemos o baú e conversemos sobre o material existente. Por que não?

Anónimo disse...

Creio que todas estas questões são pertinentes. Pelo menos já me passaram todas pela cabeça numa ou noutra altura da vida. Não sei se a todas as mulheres em geral e às lésbicas em particular se colocam tais questões, no entanto penso que será útil trocar impressões e experiências. Creio que não há nada pior que o isolamento e o silêncio e as mulheres sempre foram "sacrificadas" nestas coisas do sexo. Mesmo que o nosso crescimento tenha sido libertador há sempre marcas que ficam da educação e da formatação hetero a que fomos submetidas. Parabéns pela iniciativa! Vou tentar participar activamente no debate.

Anónimo disse...

Será legitimo separar amor de sexo?
Por uma questão de avaliação talvez.Tudo se confunde quando existe harmonia.Muda de figura quando não nos identificamos de uma forma ou de outra.Não acredito que uma relação perdure só pelo sexo.Esse é substituivel.A minha meta é o amor porque,quando o fim do arco-iris nos premeia,tudo de bom vai acontecendo...
Sejam felizes!

Anónimo disse...

Amor e sexo são coisas diferentes e por isso existem duas palavras na nossa e em todas as outras línguas. Creio que, na generalidade, a mulher foi treinada para aliar as duas coisas, o que acabamos por fazer, cumprindo a finalidade inicial dessa 'construção', que é apenas e afinal deixar o caminho livre aos homens para reinarem nas suas capoeiras e tanto quanto queiram fora delas. Mas acho que é fácil entender que, só por se ser mulher, não estamos livres de sentir desejo apenas, muitas vezes sem amor, de nos comportarmos como galos e, claro, sermos tão promíscuas (libertinas) quanto quisermos. A questão é: a altura não está para graças, porque sabemos hoje muito claramente as consequências das práticas sexuais de risco. Mas lá que tem montes de graça sair para a caça, lá isso...

Anónimo disse...

Cesarina, não preciso escrever mais nada, subscrevo inteiramente o teu comentário.
Marta

Anónimo disse...

olá Tangas,
agradecida por tentares dar a volta ao texto.
Torradas queimadas – uma excelente receita. Quando eu falava em receitas, não me referia a receitas estritamente culinárias. Talvez tenha um humor dificil de entender. Bem mas vou tentar responder sériamente às perguntas e escolhi a 3ª. pergunta para a minha redacção:
Porque é que, por vezes, entre duas pessoas com uma relação amorosa, o desejo sexual permanece vivo, mas a atracção sexual deixa de existir? Uma vez li, que o sexo num casal pode ser como uma sopa aquecida, que por vezes sabe melhor, que a sopa acabada de cozinhar. (Mais uma receita! sopa aquecida.) Mas a sério agora:
a) o desejo sexual permanece vivo, porque é uma fenómeno da vida. Esse permanece sempre vivo num ser humano saudável na idade adulta. Excluídos estão certos estados ou fases da vida onde o desejo sexual diminui ou desaparece, que pouco ou nada têm a haver com a relação.
b) ... mas a atracção sexual deixa de existir. A atracção sexual pode deixar de existir, por várias razões.
1)A relação pode simplesmente ter chegado ao fim, isto é cumpriu a sua finalidade, deixou de fazer sentido.
2) Mas há outras razões mais interessantes aqui. As duas não souberam preservar a sua vida sexual. (Aqui fala a perita em sexo). O que perturba a ligação sexual, podem ser variados problemas (p.ex. torradas queimadas) e as duas pessoas, evitam falar deles, porque têm medo de falar deles, não sabem como falar deles ou não sabem outras formas de os resolver. Em consequência, evitam a intimidade mútua e por fim evitam a pessoa da relação. Resurge o desejo sexual, porque é natural, e mais fácil é procurar uma terceira pessoa e fugir da relação. Isto acontece muito sem as pessoas tomarem bem consciencia do que aconteceu.

Anónimo disse...

Okay, passamos das torradas queimadas às batatas, ou seja, às coisas evidentes.
Tudo o que dizes tem imensa razão de ser mas, quanto a mim, a emoção - e neste caso a emoção ligada à relação com outra/o - virou igualmente um produto e de grande consumo.
Vemos tudo assim: consumir é que é preciso e, sempre que surge uma novidade, por que não aproveitar? Nem é preciso ser-se rico ou ter posses para saltar para um novo produto emocional...
Infelizmente, 70 por cento das relações funciona assim, 25 por cento na base da conveniência (há outros produtos em causa..) e cinco por cento balançam entre um esforço genuíno e o que acham que está certo.
Sendo que a relação a dois é uma questão que cresce e, portanto, se comlica, e sendo que a sua natureza sexual cresce igualmente e também se complica, com uma mentalidade consumista não admira que não haja tempo para entender e aprender a funcionar com tudo isso.
(Esta é a parte deseinteressante da conversa que, provavelmente, inibirá muito boa gente de meter a colher aqui...)

Anónimo disse...

Olá,
O consumismo da emoção: é uma questão interessante. Mas vejamos que emoções estão em causa. Há a emoção sexual, ou seja as borbuletas na barriga e a excitação, o orgasmo, o amor, o prazer de estar a dois. E que mais há? O prazer da aventura e da conquista, de uma nova pessoa, da novidade. É a isso que te referes, Tangas?
Vivemos no consumismo, compra-se novo e logo se deita fora, para comprar mais outro produto novo. Há pessoas que vivem num imediatismo muito grande, porque não acreditam no futuro. Isso transposto para as relações sexuais, significa outra, outra e outra. Esta gaja é super, por isto e aquilo, e a outra tem ou sabe qualquer coisa de especial e logo estou insatisfeita com a que tenho e quero a outra. Isto traduzido é uma constante insatisfação e fuga de si mesma.
Mas as deusas, que fizeram o mundo, queriam que a gente se amasse, também nós as lésbicas, senão não nos teriam feito. E por isso muniram-nos de emoções sexuais. Agora, que seja por consumismo, ou por sensacionalismo, ou por aventureirismo, não interessa. O que interessa é que elas (as deusas) conseguiram o seu objectivo! Que a gente se ame.
Elas (as lésbicas) um dia verão que ficaram com indigestão, devido a demasiadas mixórdias nas emoções, aí terão mesmo juízo. (Por isso a minha insistência nas receitas. )

Anónimo disse...

Tudo bem, temos o consumismo também no sexo.
Mas não acho que seja isso o pior, o mais intragável. Estou convencida que o «consumismo sexual» é um problema mais de idade e depois de insatisfação que de consumismo propriamente dito.

Há a aventura, por certo. Que para mim é de espaço mais alargado que o café, as primas, o Mr Gay, etc. Para mim a aventura não é o engate.
É algo derivado do modo de vida, da contingencia, da necessidade sexual e de um súbito encantamento. É de alto risco, evidentemente, já que pode levar ao corte com o passado.

O que tenho dificuldade de entender são as relações felizes sem sexo. As pessoas que querem viver juntas, estar juntas, que defendem a «união» em pormenor, mas que fazem vida sexual com outra ou outras. Isso baralha-me a cabeça.

Anónimo disse...

olá Samartaime
De certo que no jardim zoológico das lésbicas há todo o tipo de espécimes quanto à vida mais particular de cada uma. Há umas que fazem assim, outras que fazem assado – (hé, hé, voltámos aos cozinhados). As situações que descreves podem não ser estáticas, permanentes. Tudo está em constante transformação, também a forma como as pessoas se relacionam. E além disso as coisas podem não ser aquilo que parecem. Ou um dia parecem uma coisa, outro dia parecem outra.
Uma relação pode ser feliz sem sexo, durante algum tempo, p. ex. umas horas, uns dias, mas talvez não dure 10 anos nesse estado. Ou então é uma simples relação de amizade.

Anónimo disse...

por que é que diz jardim zoológico das lésbicas???

Anónimo disse...

Digo jardim zoológico para expressar que há uma grande variedade de formas de ser lésbica, de viver a sexualidade e as relações.